Monday, June 27, 2005

"Vocês não sabem o que perdem."

Do 7º jogo da final da NBA ao 2º jogo da final do campeonato de futsal, vai uma importância enorme.
No primeiro caso estão envolvidas somas monetárias incríveis, sendo os maiores torcedores de parte a parte os patrocinadores respectivos. Ganharam os Spurs. Podiam ter ganho os Pistons que o meu espírito não se mexia uma palha (eu até gosto mais dos Pistons, por causa da célebre equipa de "Bad Boys" com Rodman incluído). Quanto à final do futsal: o que dizer de uma final que se decide entre rivais citadinos, onde o barulho no pavilhão é explosivo e onde os golos foram festejados como se da equipa de onze se tratasse?
A grande diferença entre as finais da NBA e do futsal é a nossa cultura "futebolística". É-me inaceitável que os Pistons tenham jogado fora sem uma invasão dos seus fãs. É-me inacreditável que os vencedores não tenham invadido a cidade numa festa louca até às tantas (não há palavras para a nossa festa, mas o mesmo dirão os adeptos do Chelsea e Barça). Afinal, o que é que se passa com aquela gente?
Dir-me-ão que o desporto deles é mais justo, mais equilibrado, que há "fair-play", etc. E então?E a paixão? E o ódio a uma equipa rival? E um derby? E um "sector ospiti"?
Os americanos nunca perceberão o futebol. Vão sempre vê-lo como mais um desporto onde se come batatas fritas e se bebe coca-cola na bancada. Vão sempre vê-lo como mais um desporto onde os clubes podem mudar de cidade.
Pobres coitados. Há uma história fabulosa de Jorge Valdano (nos seus espectaculares "Cuardenos de Valdano"), também a propósito da cultura desportiva americana (jogos olímpicos de 96 se a memória não me trai) em que há uma sepultura de um adepto do Nápoles que tem escrito: "Taça UEFA e dois Campeonatos. Vocês não sabem o que perderam" num recado espectacular a todos os vivos que não viram essa conquista. Valdano remata a crónica em grande estilo, dizendo aos americanos: "Vocês não sabem o que perdem."
E é esse também o meu recado aos americanos. Quem vos dera festejar os golos da final de futsal como eu festejei. A paixão, a entrega, os emblemas, os jogadores míticos, as bancadas a cantar, os sócios que parece que sempre viveram na sua cadeira no estádio... Quem vos dera saber o que é isto.

"Vocês não sabem o que perdem. "

Friday, June 17, 2005

"What does being a fan mean?"

A frase que mais gosto de dizer depois de ler alguma coisa, a frase que é a nota máxima para os meus sentidos quando leio algo é poder dizer: "É isto mesmo. É isto que eu sinto."
Lemos à procura de ideias novas e lemos à procura que alguém verbalize coisas que nós já sentimos. Quando escrevo neste blog, tento, humildemente, verbalizar o que eu sinto quando vejo o meu Benfica para tentar passar isso.
Li um artigo na Time que me fez pensar centenas de vezes: "É isto. Ser adepto é isto. Este gajo apanhou a essência."
Com a devida vénia, deixo-vos o último parágrafo do artgio "Hopelessly Devoted" de Michael Elliott, um adepto do Liverpool, que escreve o artigo depois da final da Liga dos Campeões. O parágrafo vai todo traduzido, excepto a última frase, que diz tudo. Espero que, como eu, acabem o parágrafo a concordar com o homem. E se possível, leiam o artigo todo.

"...mas ser adepto é mais do que derrotar a distância e a geografia. É a nossa máquina do tempo pessoal. Se há coisa que eu fiz de forma consistente nos últimos 50 anos foi apoiar o Liverpool. Ser adepto é uma benção, porque nos liga à infância como mais nada o faz, e a tudo e todos que marcaram as nossas vidas entre a infância e o presente. Por isso, (...) quando vi o jogo na televisão, não tive que estar à procura dos fragmentos da minha vida. Eles estavam todos à minha volta. Chá em casa da minha Avó depois de um jogo; o meu tio favorito que morreu muito cedo; namoradas que não perceberam a essência disto (casei com a única que percebeu); o meu bolo do 21º aniversário, feito pela minha mãe, com as cores do Liverpool; as minhas filhas vestidas com os primeiros equipamentos delas; os grandes amigos com quem já não falo há muito.

What does being a fan mean? It means you`ll never walk alone."


É incrível como ao escrever isto, mesmo depois de já ter lido e re-lido o texto, não deixo de repetir: "É isto. A essência disto tudo é isto."

Obrigado ao D., por me mostrar o artigo.

Tuesday, June 14, 2005

Goleadores

A propósito do facto do Benfica querer um goleador (e também pelo facto de agora ser difícil arranjar motivos para escrever) ocorreu-me a seguinte história, que li no jornal "Marca" há uns três ou quatro anos:

Menotti um dia recebeu a visita de um olheiro, que lhe disse: "Fui ver um jogo de miúdos. Uma equipa ganhou 14 - 0. Tinham dois avançados: um fintava os outros miúdos todos, e fez as 14 assistências. O outro era um "gordito" que marcou os 14 golos."
"Então traz-me o gordito."
Esse gordito chamava-se Gabriel Batistuta.


Os goleadores são o sonho de qualquer miúdo. O jogador que não tem que passar a bola, que só chuta e pode ser o herói. O jogador por quem as bancadas cantam. O nome dos goleadores é o nome pelo qual os miúdos querem ser tratados no futebol de rua.
Porque os goleadores têm um personalidade própria, sem aquela poesia toda dos números 10, sem a abnegação dos centrais e sem a disponibilidade de um médio. São egoístas, frios e cínicos. E cumprem o seu papel como se de empregados de escritório se tratassem e às vezes tão bem, que ninguém dá por isso. Veja-se o caso de Ronaldo: em má forma, gordo, com "problemas matrimoniais", numa equipa de anjos em queda e estrelas em decadência, marcou 23 golos. Menos um que o "Super Etoo".

Peço então ao meu Benfica que não vá buscar aquilo a que os espanhóis chamam um "nove e meio". Eu quero um número nove. Um matador. "Gordito" até, se for preciso.
Alguém que o meu irmão mais novo possa dizer que é, quando for jogar à bola com os amigos.

Saturday, June 04, 2005

Alemanha - Portugal: Valsa Quase Antidepressiva

A RTP Memória tem trazido de volta clássicos do futebol português. Foi com deleite que já revi o 3-6 em Alvalade, o 2-3 no Bessa com o Paulo Sousa à baliza e foi também com horror que desliguei a TV sempre que aparecia um jogo que o SL Benfica não ganhou.
Mas na quinta à noite assisti a um jogo também ele mítico e que me fez ir dormir a pensar muito: Alemanha - Portugal, 1997, em Berlim, o célebre jogo da expulsão do Mago Rui Costa. Já disse mil vezes que não sofro com a selecção. Aliás, o que eu mais gosto das quinas é vê-las na camisola do Benfica, portanto estão a ver o meu tipo...
Mas, pela paixão ao jogo, envolvo-me quando me apercebo que estou perante um jogo que vai ser sempre lembrado. E se assim foi no Portugal - Inglaterra, mais foi nesse Alemanha - Portugal. O jogo foi incrível. Se com a Inglaterra o que valeu foi a emoção, os golos, o pontapé do Rui Costa, ali foi a Valsa, uma Valsa Quase Antidepressiva (um doce para quem souber a banda que toca esta música...) com que a "geração de ouro" nos brindou a todos.
Esse jogo foi o paradigma da vida daquela selecção. Como se o futebol fosse (e na maior parte das vezes é...) uma metáfora da vida. Naqueles 90 minutos há um sentimento trágico, quase de"Romeu e Julieta", da história que está a ser linda e que acaba mal por injustiças do destino. E até eu, Clubista cego que gostava que os jogadores da minha equipa nunca fossem à selecção para não se poderem lesionar, acabei o jogo (não em 97, mas agora!!) a perguntar: "Como é possível?".
Portugal jogou, como era costume naquela altura, sem ponta de lança. Do meio campo para a frente jogaram Paulo Sousa, Rui Costa, Figo, Pedro Barbosa e JVP. Tudo artistas. Abriram o livro nesse dia. Quase me apeteceu por uma valsa a tocar enquanto via o jogo, para acompanhar cada vez que o Rui Costa metia a bola entre as pernas de um alemão e dava aqueles saltos para evitar as pancadas. 80 minutos do futebol mais rendilhado possível. Parecia que jogavam "à rabia". Uma verdadeira delícia. Mas sentia-se, em todo aquele jogo (mesmo nesse recital), a nuvem negra do destino. Toda a gente sabe que o Romeu e Julieta acaba mal, mas não deixamos de torcer por eles. Ali foi exactamente igual. Mesmo em 97, sem conhecer o fim do jogo, e de boca aberta com a fluidez de jogo, o facto de não entrarmos na área deles, e toda a inconsequência daquilo, antevia a tragédia de Batta.
Eis que chega o golo de Portugal. Um jogadão. Brincam com os alemães no meio campo, trocam-lhes as voltas, Barbosa e Figo tabelam e o primeiro remata com o peito do pé. Nesta altura, em Maio de 2005, interrogo-me se Portugal se deixou mesmo empatar. E, estupida e infantilmente, como uma adolescente de 13 anos que acha que é a Julieta, acreditei que Portugal até se ia aguentar.
Mas a coisa passou-me logo a seguir, porque a nuvem trágica que vos falava deu o seu maior sinal: nova "rabia" aos alemães, duas tabelinhas de livro, e o Rui, o meu Rui, o nosso Rui, falha à frente do Koepke o que seria o 0-2. No fim dessa jogada é expulso. Depois vem o 1-1. E só mesmo para chatear, com 10 jogadores, Portugal faz 5 minutos finais com 3 golos falhados. A tragédia finaliza-se. A valsa acaba. Quase, quase antidepressiva.
Este jogo foi o fim da "geração de ouro". Daqueles 11 que começaram o jogo, só Figo jogou a final do Europeu do ano passado. O fim da geração que foi o maior bluff de sempre da história do futebol português.
E esse jogo é uma brincadeira cruel dos Deuses do Futebol, a mostrar aos meninos que mandaram coisas da janela do hotel ao Nuno Luz, aos meninos do caso Paula, etc, o quão grandes podiam ter sido. O quanto eles sabiam jogar à bola e como eram inconsequentes. Em 90 minutos, a história dessa geração ficou evidenciada. Prometer muito e morrer de forma inglória, com uma suposta "vitória moral".
Quando o jogo acabou, desliguei a TV e fiquei a pensar no quanto o futebol tem mesmo a ver com a vida, seja dos jogadores ou dos adeptos. É incrível como alguns jogos nos marcam por serem tão depressivos, outros por serem tão bonitos e gloriosos e por aí adiante. E mais ainda, como é que a história de uma geração nacional (que gostemos ou não, é uma geração que marca as nossas vivências futebolísticas) se resume em 90 minutos. O futebol às vezes é isto: uma Valsa Quase Antidepressiva.



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Hoje a selecção joga o apuramento para o Mundial e acho que nem vou ver o jogo. Li no jornal que o sr. Batta é o chefe da arbitragem do futebol francês. É incrível como, 8 anos depois, é evidente que os "maus" ganharam nesse dia, e não há nada que se possa fazer para que isso se altere.