Tuesday, August 04, 2009

O traidor

Estava um calor do caraças, como hoje. Um tempo seco, eu tinha 9 anos e nem tinha força para jogar à bola. A notícia tinha-nos caído que nem uma bomba no ATL: "Paulo Sousa e Pacheco no sporting". Caiu-me tudo, parei de almoçar, nem sabia o que havia de dizer.
O TP, farense com uma simpatia pelo Benfica, tentava animar-me, mas nem ele acreditava. Até ele sentia a traição. Uma das imagens da minha infância é estar sentado com ele, nos bancos cor de tijolo, em silêncio, e ter-me saído inconscientemente, para surpresa da nossa educadora de infância (pouco habituada a ouvir-me dizer palavrões) um duro e seco: "Que cabrão". Parece-me que aquele momento foi a primeira vez na minha vida em que saí da infância.
O singular era propositado, a mim o que me doía era a saída do Paulo Sousa. Pacheco nem tinha sido titular na soalheira tarde em que vencemos o Boavista por 5-2 e em que aquela equipa atingiu um pico futebolístico inacreditável. Agora, o Paulo Sousa...lagarto? O TP, que odiava o sporting furiosamente (nunca compreendi muito bem porquê, mas talvez o facto de termos partilhado a mesma mesa na escola 9 anos tenha ajudado ao facto) e que nunca lhes dava tréguas, também soltou um desesperado "Que vai ser do nosso meio campo?". (Caraças, já percebíamos de bola à brava)
O resto da história é conhecida e talvez o final feliz de 1994 tenha apagado o ódio que Paulo Sousa merece.
Há uns tempos estava a sair da praia com amigos e namorada. Tudo com aquele ar estoirado de estar horas ao sol. Olhei para trás e vi... o Paulo Sousa. E disse-o. O F., um benfiquista à antiga, deu meia volta, sem perceber que eu o tinha visto no carro atrás de nós (agora que penso nisso, talvez a ideia do F. tenha sido mesmo atropelá-lo). Quando ele percebeu que tínhamos acabado de deixar o carro do Judas passar-nos à frente, foi como se lhe tivesse caído tudo. Tínhamos desperdiçado uma oportunidade de ouro.
E quando já todo o carro se ria a imaginar um excerto de porrada ao Paulo Sousa, ali estava ele. Na berma da estrada, a ir buscar qualquer coisa à bagageira. Ali, à nossa espera. O F. gritou-lhe um
traidor! que se deve ter ouvido no país inteiro. Obrigado, F. Por teres vingado aquela minha tarde de Verão de 1993, por teres feito com que esse cabrão saiba que o que fez não tem preço nem desculpa.
Porque o que esses animais fazem quando nos trocam por rivais é fazer com que miúdos de 9 anos fiquem tristes, como se o Mundo fosse uma miséria. O que esses atrasados mentais fazem é baixo, não tem classificação e só merece que, para toda a vida, sempre que pararem o carro, passem outros com gente lá dentro a fazer-lhes um sinal com os dedos e com nojo no olhar.

F. : Obrigado.

Este blog fez, no passado dia 31 de Julho, 5 anos. Cinco. Estou a ficar velho.